10 de outubro de 2018

A política externa na eleição – Monitor 3: 13/09 a 26/09

Equipe LABMUNDO, NEAAPE e OPSA

Na terceira quinzena da corrida presidencial, Álvaro Dias (PODEMOS) voltou a fazer críticas à política externa dos governos do PT. No debate promovido por SBT, Folha de S. Paulo e UOL, em 26 de setembro, Dias se dirigiu a Henrique Meirelles, presidente do Banco Central entre 2003 e 2010, e afirmou que ele, como funcionário no governo de Lula, havia contribuído para alimentar “ditaduras corruptas e sanguinárias” com dinheiro brasileiro repassado pelo BNDES por meio de empréstimos e financiamentos1.

Em entrevista ao Jornal da Globo, Ciro Gomes (PDT), ao comentar sobre o a Embraer, disse que a empresa lida com uma questão sensível “sob o ponto de vista da defesa, da segurança nacional, da engenharia brasileira, é um de dois lugares onde o Brasil ainda tem alguma potencialidade tecnológica, o petróleo, a Petrobras, e a Embraer”. Referindo-se às negociações de compra da Embraer pela Boeing, Ciro adotou um tom crítico: “dois produtos extraordinários foram desenvolvidos, estão na hora de renderem bilhões de dólares para o Brasil, e nós estamos permitindo – se isso se consumar, eu vou desfazer – que a Boeing feche a Embraer, que na verdade é o que ela pretende fazer: o KC-390, que é um supercargueiro, e o caça gripen, que houve uma raríssima – inédita na história do capitalismo – transferência para o Brasil de todo o pacote tecnológico, de maneira que isso não rompe contratos nem desfuncionaliza absolutamente nada da seriedade com que o Brasil deve continuar tratando suas relações internacionais”. 2

A campanha do candidato petista, Fernando Haddad (PT), foi bastante agitada: além do périplo pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Santa Catarina, Minas Gerais, Recife e Pernambuco, Haddad enfrentou três sabatinas e participou de dois debates eleitorais organizados pela mídia. Não obstante a agenda movimentada, o tema da política externa foi pouco mencionado. A decisão do Comitê de Direitos Humanos da ONU em defesa dos direitos políticos de Lula foi lembrada com freqüência. O tom nacionalista foi reforçado com a proposta de fortalecimento da soberania e controle nacionais sobre as riquezas do país. Nesse diapasão, Haddad criticou a venda ao estrangeiro da Embraer, feita por um governo ilegítimo, sem consulta e diálogo com a sociedade e o Congresso. Dada a importância estratégica da empresa, o candidato petista prometeu reverter sua venda, caso haja meios jurídicos para tanto. Quando questionado sobre o emprego do Exército na segurança pública, Haddad asseverou que este não constitui o papel das Forças Armadas, que devem ser empregadas na defesa do território nacional e não como força policial. Por fim, referindo-se à onda de imigrantes venezuelanos ao Brasil, o candidato petista propugnou que nosso país deve manter a tradição de acolhimento de imigrantes e de preservação da paz.3

Geraldo Alckmin (PSDB) praticamente não tratou da política externa. Entretanto, a propaganda eleitoral do candidato fez diversas relações entre a polarização na disputa presidencial entre Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL), afirmando que ambos gerariam um “risco de o Brasil se tornar uma Venezuela”4. Por fim, Alckmin afirmou, em 17 de setembro, durante coletiva de imprensa a agências internacionais e correspondentes estrangeiros na sede do PSDB, em Brasília, que era contra uma intervenção militar na Venezuela, mas defendeu que o Brasil abrisse novos canais de diálogo a fim de tentar ajudar a resolver a crise na nação vizinha5.

Em entrevista à revista Exame, Guilherme Boulos (PSOL) reafirmou que um governo seu seria a favor do acolhimento de venezuelanos, através seja da concessão de refúgio, seja do provimento de trabalho. Baseando-se na Lei de Migração de 2017, afirmou que não se pode tratar o imigrante como uma ameaça à segurança nacional. Quanto à crise no país, Boulos novamente disse que o Brasil deve defender o respeito à soberania venezuelana6. Sobre a disputa comercial em andamento entre Estados Unidos e China, defendeu que o Brasil deve se posicionar protegendo sua soberania e a independência da sua política externa, sem qualquer tipo de subordinação a nenhum dos dois países. Por fim, voltou a enfatizar a importância da cooperação Sul-Sul para as relações externas brasileiras7.

Jair Bolsonaro (PSL) continuou em internação hospitalar no período. Tendo feito apenas algumas transmissões ao vivo na internet e concedido uma entrevista à Jovem Pan, em nenhum momento fez menção a temas de política externa. Já o vice-presidente na sua chapa, General Hamilton Mourão, deu declarações pertinentes. Em um discurso feito no dia 17 de setembro, na sede do Secovi (Sindicato da Habitação), em São Paulo, Mourão criticou a política externa dos governos do PT, quando o país teria adotado a “diplomacia que foi chamada de Sul-Sul”. Classificou como “mulambada” os principais países que foram parceiros da cooperação com o Brasil, visto que essas relações não teriam resultado em nada e que, segundo ele, só teriam gerado dívidas. Argumentou ainda que a diplomacia que deve priorizar acordos bilaterais com os “grandes mercados, aqueles países que têm importância dentro do conselho das nações”.8

Em entrevista ao G1 e à CBN9, João Goulart Filho (PPL) voltou a se opor ao uso das Forças Armadas na segurança pública. Na mesma oportunidade, disse que, se eleito, não limitaria a entrada de venezuelanos no Brasil; garantiu que não daria um calote na dívida externa; e defendeu medidas de proteção da indústria nacional, com mudanças nas tarifas alfandegárias para dificultar a importação de produtos que possam ser fabricados no país, especialmente por empresas brasileiras. De maneira geral, o candidato tem priorizado pautas internas, especialmente trabalhistas e da retomada da agenda de reformas de seu falecido pai.

No dia 22, a revista Exame publicou uma entrevista com Marina Silva (REDE) sobre assuntos de política externa10. Na temática sobre a migração de venezuelanos para o Brasil, Marina afirmou que o país deve manter a tradição de país aberto a pessoas de todos os lugares e de solidariedade internacional; que a Venezuela vive hoje uma tragédia econômica, política e humanitária; e que o Brasil foi cúmplice da crise porque os governos anteriores apoiavam o chavismo. Marina pontuou que países com populações menores, como Colômbia, Equador, Peru e Chile, têm recebido mais refugiados que o Brasil e que acolher pessoas de outras culturas geralmente é positivo para a nação receptora no médio e longo prazo. A candidata também afirmou que a América Latina deve ser prioridade central na política externa brasileira e que os objetivos da integração com o subcontinente, como a prosperidade comercial, a democracia e os direitos humanos, devem ser resgatados. A respeito das negociações entre o Mercosul e a União Europeia, Marina declarou que, com um Mercosul livre de barreiras internas e modernizado, as negociações com a UE devem ser concluídas. Sobre os BRICS, afirmou que a política externa deve seguir promovendo a participação em esquemas plurilaterais de concertação e enfatizou a importância de mecanismos próprios de financiamento ao desenvolvimento. Ao ser questionada sobre a guerra comercial entre China e Estados Unidos e seus impactos sobre o Brasil, Marina respondeu que as relações com a China devem ser prioritárias pela magnitude das cifras e dos desafios, que o Brasil deve se atentar à pauta de exportação para substituir as indústrias de baixo custo por indústrias intensivas em conhecimento e para que os investimentos chineses sirvam para parceria, utilização de insumos locais, criação de capacidade de pesquisa e desenvolvimento e contratação de mão de obra brasileira. Por fim, ao responder sobre a importância do multilateralismo, Marina afirmou que o protagonismo brasileiro deve ser na atuação em organismos multilaterais, ao mesmo tempo em que busque a expansão de mercado para nossos bens e serviços em arranjos bilaterais.11

Também em entrevista à revista Exame12, a candidata Vera Lúcia (PSTU) novamente adotou uma postura de solidariedade aos refugiados venezuelanos e de defesa da derrubada de Nicolás Maduro, assim como contra a direita que lhe faz oposição. Defendeu a instauração de um governo dos trabalhadores naquele país. Da mesma forma, reivindicou a aproximação e a integração da classe trabalhadora na América Latina, o que serviria como uma forma de se contrapor o Mercosul, que, à semelhança da União Europeia, seria um bloco a serviço do capital e das multinacionais – qualificação que também estendeu ao BRICS. A candidata pautou um desejo de rompimento com a ordem neoliberal internacional timoneada pelos EUA, substituindo-a pelo internacionalismo com base na solidariedade e na cooperação entre as classes trabalhadoras – e não mais entre governos.

Não se pronunciaram sobre política externa: Cabo Daciolo (PATRIOTA), Henrique Meirelles (MDB), João Almoedo (NOVO) e José Maria Eymael (DC).

1 FOLHA DE SAO PAULO. Eleições 2018: Vice-líder nas pesquisas, Haddad vira alvo de rivais em debate. 26/09/2018. Disponível em: https://aovivo.folha.uol.com.br/2018/09/26/5521-aovivo.shtml?utm_source=twitter&utm_medium=social&utm_campaign=twfolha. Acesso em: 26/09/2018.

2 GLOBO. Ciro Gomes (PDT) é entrevistado no Jornal da Globo, 17/09/2018. Acesso em: 26/09/2018. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/7025310/.

3 GAZETA DO POVO. Debate TV Aparecida com candidatos a presidente: acompanhe em Tempo Real, 18/09/2018. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/eleicoes/2018/debate-tv-aparecida-com-candidatos-a-presidente-acompanhe-em-tempo-real-8nzg710qo7i0cqlvtefvhqch0. Acesso em: 30/09/2018. PT. Assista: Haddad e Manu fazem caminhada por Vitória da Conquista, 15/09/2018. Disponível em: http://www.pt.org.br/assista-haddad-e-manu-fazem-caminhada-por-vitoria-da-conquista/. Acesso em: 30/09/2018. PT. Assista: Fernando Haddad participa de ato em Florianópolis, 18/09/2018. Disponível em: http://www.pt.org.br/__trashed-62/. Acesso em: 30/09/2018. PT. Assista: Fernando Haddad participa de sabatina na rádio CBN, 18/09/2018. Disponível em: http://www.pt.org.br/assista-fernando-haddad-participa-de-sabatina-na-radio-cbn/. Acesso em: 30/09/2018. PT. Assista: Haddad visita Centro de Monitoramento de Desastres, 20/09/2018. Disponível em: http://www.pt.org.br/assista-haddad-visita-centro-de-monitoramento-de-desastres/. Acesso em: 30/09/2018.

4 O GLOBO. Após Alckmin, Bolsonaro usa ‘risco Venezuela’ em vídeo de campanha. Publicado em 30/09/2018. Acesso em 07/10/2018. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/apos-alckmin-bolsonaro-usa-risco-venezuela-em-video-de-campanha-23093572

5 O GLOBO. Alckmin afirma ser contra intervenção militar na Venezuela, mas defende novos canais de diálogo. Publicado em 17/09/2018. Acesso em 07/10/2018. Disponível em: https://www.terra.com.br/noticias/brasil/alckmin-afirma-ser-contra-intervencao-militar-na-venezuela-mas-defende-novos-canais-de-dialogo,ef4ec0ef01658d56505369f40cd64d12jhzbpv84.html

6 EXAME. O que os candidatos… 26/09/2018. Disponível em <https://exame.abril.com.br/mundo/o-que-os-candidatos-a-presidencia-pensam-sobre-a-crise-na-venezuela/>. Acesso em 26/09/2018.

7 EXAME. Como os candidatos… 25/09/2018. Disponível em <https://exame.abril.com.br/mundo/como-os-candidatos-a-presidencia-vao-agir-na-guerra-comercial-eua-x-china/>. Acesso em 26/09/2018.

8 UOL. 17/09/2018. Vice de Bolsonaro, Mourão chama países emergentes de “mulambada”. https://noticias.uol.com.br/politica/eleicoes/2018/noticias/2018/09/17/mourao-vice-de-bolsonaro-chama-aliados-do-brasil-de-mulambada.htm. Acesso: 26/09/2019. CORREIO DA AMAZÔNIA. General Mourão chama países africanos de “mulambada”. https://correiodaamazonia.com/general-mourao-chama-paises-africanos-de-mulambada/ Acesso: 26/09/2019

9 G1. G1 e CBN entrevistam João Goulart Filho. 14/09/2018. Disponível em: <https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/ao-vivo/entrevista-joao-goulart-filho-g1-cbn.ghtml> Acesso em: 25/09/2018.

10 EXAME. Eleições 2018: o que pensa Marina Silva sobre política externa. Publicado em: 22/9/2018. Acesso em: 26/9/2018. Disponível em: https://exame.abril.com.br/mundo/eleicoes-2018-o-que-pensa-marina-silva-sobre-politica-externa/.

11 Vale mencionar ainda que, no dia 24 de setembro, o juiz Rolando Valcir Spanholo, da 21ª Vara Federal, concedeu liminar que anula a concessão de patente do fármaco Sofosbuvir, da empresa estadunidense Gilead Sciences, que faz parte do tratamento contra a hepatite C. A ação foi de iniciativa de Marina Silva e ia contra a decisão do Instituto Nacional da Propriedade Industrial que impedia a fabricação do genérico no Brasil. MARINA SILVA (site oficial). Justiça atende pedido de Marina… Publicado em: 24/9/2018. Acesso em: 26/9/2018. Disponível em: https://marinasilva.org.br/justica-atende-pedido-de-marina-e-eduardo-e-concede-liminar-que-quebra-patente-de-remedio-contra-hepatite-c/.

12 EXAME. Eleições 2018: o que pensa Vera Lúcia sobre política externa. 24/09/2018. Disponível em: <https://exame.abril.com.br/mundo/eleicoes-2018-o-que-pensa-vera-lucia-sobre-politica-externa/> Acesso em 25/09/2018.

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